terça-feira, 30 de setembro de 2008

Mulher de valor

Uma revista semanal tem como tema de destaque a infidelidade feminina e dedica várias páginas às histórias de vida dupla das entrevistadas. Mulheres casadas, aparentemente dedicadas ao marido e aos filhos, que pela sombra são tudo menos virtuosas. Quem lê fica alarmado, especialmente os homens, casados ou a pensar nisso. Pelos vistos, ser traído é inevitável e só não acontece a quem não sabe. Errado, meus caros. Há pelo menos uma esposa fiel em Portugal.

Um amigo meu tentou ligar para o telemóvel de uma amiga mas enganou-se a marcar o número. Recebeu logo uma mensagem:
- “Ligar a estas horas…quem és?”
- “Desculpa, enganei-me no número.” – respondeu ele, bem educado e sem se alongar
- “Não sei quem és e não te quero conhecer, tenho marido. Não me ligues a estas horas,
preciso de descansar, tenho asma, diabetes e problemas de coração.”

Toma lá!Quais donas de casa desesperadas por casos extra-conjugais? Só se for nos E.U.A!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Os sapatos da Lúcia - parte 2

Não podia ser de outra maneira.
A rapariga foi viver com a tia e passou de desgraçada a adorada. Fez um bom casamento (entenda-se com um homem rico), ganhou beleza e estatuto social. Certo dia recebe um convite para o mesmo baile ao qual tinha ido 20 atrás...


“ E pareceu a Lúcia que era preciso que agora ela fosse àquele baile para com o seu triunfo, apagar, até ao último vestígio a memória da humilhação ali antes sofrida. Era preciso que ela (…) pudesse naquela noite perguntar a todos os espelhos da casa: - Dizei-me espelhos, qual é a mais bela, a mais perfeita, a mais rica de triunfo, aquela que está em seu reino mais segura? E era preciso que todos os espelhos, até de madrugada lhe respondessem: - Tu.”

Aparece então na grande sala de baile, deixando todos boquiabertos com a sua fabulosa figura, desde o vestido chique ao brilho dos sapatos bordados com brilhantes. Dança e de espelho em espelho, confirma a sua vitória. Só resta o espelho da sala onde há 20 anos se escondera.

“Lúcia fechou a porta atrás de si e virou-se para o espelho. Era o mesmo espelho, ainda lá estava. Mas também a mesma imagem lá estava ainda.
Todo o seu corpo gelou num momento de horror. O seu sangue parou de correr. Um grito ficou estrangulado na sua garganta. Viu-se e viu que o vestido que ela tinha vestido era ainda o mesmo, era ainda o antigo vestido lilás. (…) queria gritar mas o grito estava preso à garganta.(…) Então o espelho muito devagar começou a mover-se. Girou lento sobre si mesmo e a porta abriu-se deixando entrar um homem (…) Inclinou-se ligeiramente, com ar amável, segurou o braço de Lúcia e disse : - Vamos para a varanda. (…) – Parece-me que não o conheço. – Conheces. (…) Há vinte anos, aqui, nesta varanda escolheste o outro caminho. Eu sou o outro caminho. (…) Quero o sapato do teu pé esquerdo. (…) Tu venceste sempre. Dá-me o teu sapato: é o preço do mundo. – Não posso ficar no meio de um baile com um pé calçado e outro descalço. – Quando te encontrei aqui há 20 anos também tinhas um pé calçado e outro descalço. Mas eu penso em tudo. Não me esqueço de nada. Trouxe outro sapato para o teu pé esquerdo.”
Algum palpite? “Era um sapato de salto alto, forrado de seda azul, velho, miserável, esfarrapado. Lúcia quis fugir mas o seu corpo estava rígido (…) O homem inclinou-se, tirou-lhe do pé o sapato de brilhantes e calçou-lhe o sapato de farrapos.”


Entre alguns arrepios, lembro-me de frases oportunas : “Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.”Mt 6:24; “Onde estiver o vosso tesouro, ai estará também o vosso coração” Mt 6:21.


“Quando ao clarear do dia encontraram Lúcia morta na varanda, ninguém quis acreditar no que via. Mas veio o médico e constatou que a morte tinha sido causada por uma síncope cardíaca. Era uma explicação. O facto de ter desaparecido o sapato também era explicável: alguém (…) não tinha resistido à tentação dos brilhantes. Mas o que era inexplicável era o facto de ela ter no pé esquerdo um sapato (…)” que nem é preciso descrever.



Resumindo, se o teu tesouro reside em calçado o teu coração não vai aguentar ficar só com metade de um par.

“Entrai pela porta estreita (larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz para a perdição e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a porta e apertado o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela.” Mt 7:13 e 14

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Os sapatos da Lúcia - parte 1

Reli hoje a história da gata borralheira de Sophia de Mello Breyner Andresen. É sobre uma jovem pobre chamada Lúcia que é convidada pela tia-madrinha para um baile de gente rica. Fica absolutamente deslumbrada mas como leva um velho vestido lilás emprestado faz péssima figura e passa uma enorme vergonha.

“A grande sala estava cheia de gente dançando, pares que se multiplicavam nos enormes espelhos esverdeados.(…) A filha da dona da casa apresentou Lúcia às amigas. Estas falaram-lhe com um ar alheio e sorriram com ar indiferente. Depois continuaram as suas conversas como se ela não estivesse ali. (…) Lúcia olhava-as com um misto de temor e fervor. Pareciam-lhe todas bonitas, animadas por uma vida rápida e segura (…) Os rapazes convidaram as raparigas para dançar e o grupo desfez-se. Lúcia ficou sozinha. (…) pousaram nela um olhar duro como se Lúcia fosse uma intrusa e elas a quisessem pôr fora da sala, empurrando-a com o olhar.”
A noite avança e a rapariga sente-se cada vez mais humilhada. Nunca experimentei um vestido lilás de uma tia-madrinha e deprimo-me só de pensar… Para além disso,ainda teve de levar uns sapatos em segunda mão (expressão engraçada) que “estavam fora de moda e em mau estado com o forro azul roto nas biqueiras e aqui e além manchas de bolor”. Perigosos porque eram largos, a coitada passou a noite a tentar escondê-los sob o vestido comprido. Até que pára perto a uma janela e fica a observar o jardim. Junta-se-lhe um rapaz.
“ – Ainda é Primavera e já é Verão. As noites, neste tempo do ano, são uma maravilha, apetece vivê-las minuto a minuto, não perder nem um instante delas, nem um suspiro da brisa. – É maravilhoso – aprovou Lúcia tentando mais uma vez captar o estilo da conversa. (…) – Estas noites assim não a assustam? (...) Tanto azul, tantos brilhos, brisas, perfumes, parecem a promessa de uma vida deslumbrada que é a nossa verdadeira vida. Mas, ao mesmo tempo há nestas noites uma angústia especial – há no ar o pressentimento de que nos vamos despistar, nos vamos distrair, nos vamos enganar e não vamos nunca ser capazes de reconhecer e agarrar essa vida que é a nossa verdadeira vida.”
Passada alguma insistência, aceita dançar com ele e consegue esquecer-se dos desconfortáveis sapatos. Mas um escorrega para o meio do salão, causando furor entre os snobes. Lá disfarça e sai discretamente. “ Levantou-se e saiu da sala (…) Já tinha acabado a hora das chegadas mas ainda não tinha começado a hora das partidas. (…) espreitou: era uma pequena sala vazia. Entrou e fechou a porta atrás de si. Mas então viu que o lado de dentro da porta (…) era, de cima a baixo, forrado de espelho. E nesse espelho ela viu-se toda, pálida, com o vestido detestado escorrendo desde os ombros até aos pés. (…) em toda a parte o espelho a via. (…) refugiou-se na varanda.” Onde fica, lamentando-se e sonhando até se lembrar da proposta da abastada madrinha para ir viver com ela, agora que tinha completado 18 anos. E n
esse momento decide aceitar. “(…) Não queria não se importar. Aquele baile, aquela gente que a ignorara e humilhara era o mundo que ela decidira escolher. Aqueles eram os vestidos, os sapatos, as jóias que ela queria possuir.(…) – Tenho de escolher outro caminho. Um dia hei-de voltar aqui com um vestido maravilhoso e com sapatos bordados de brilhantes.”´
Continua amanhã...

domingo, 21 de setembro de 2008

Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Carlos Drummond de Andrade

É a vida. =)

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Um bom conselho: quando vos requisitarem para opinar acerca de um objecto artístico, certifiquem-se sempre que quem pergunta não é o próprio autor … Senão arriscam-se a fazer figura de parvos, como eu. “Não é bem o meu estilo” também não consola.
Sensibilidade e bom senso faziam-me muita falta…
170 horas de trabalho a dividir por 2 semanas, incluindo o fim-de-semana, dá aproximadamente 14 horas diárias (170/12).É verdade, a faculdade espera que eu me dedique a uma cadeira 14 horas por dia, durante 12 dias. Astérix diria“Estes romanos são doidos!”. Eu não digo nada.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Soube há dias que, segundo um estudo londrino, o hipocampo dos taxistas é mais desenvolvido que o dos cidadãos comuns. Julgava que era só o bigode. Às 10h da manhã, perante isto, qualquer estudante fica incapacitado para reter quaisquer adicionais trivialidades sobre o Sistema Nervoso.

Depois de um dia de grande desassossego, precisei ler mais sobre o assunto.


´Estudo descreve 'GPS' em cérebro de taxistas londrinos
"Cientistas descreveram o que chamaram de uma espécie de "sistema de navegação" nos cérebros de motoristas de táxi londrinos. (…) Estudos anteriores já haviam mostrado que os motoristas de táxi possuem maior hipocampo – região do cérebro que desempenha um papel crucial na localização espacial e na navegação
.”
Ninguém adivinhava que os modos bruscos e a linguagem popular eram apenas uma máscara da enorme potência cerebral destes homens. Não se tratam de simples motoristas – fio de ouro a reluzir sob a camisa xadrez arejada – são antes exemplos inspiradores de desenvolvimento cerebral.
“Segundo os cientistas, o cérebro até "cresce de tamanho" à medida que coleta informações detalhadas necessárias para percorrer e se localizar nas labirínticas ruas da capital britânica.” – que por certo, estão alguns níveis de dificuldade abaixo de Lisboa.
Ando eu a estudar desalmadamente e nem as notas aumentam
Está visto, da desconfiança à glória vai apenas um passo. Notícias como estas revolucionam estereótipos sociais.

Observaram-se também “ mudanças de actividade em diferentes regiões do cérebro quando os taxistas enfrentavam situações inesperadas, como um cruzamento bloqueado.” Não consigo discriminar anatomicamente tais regiões mas é fácil imaginar algumas manifestações orais, um tanto ofensivas, que ai são concebidas. Mais uma vez, frutos da sofisticação neuronal destes indivíduos.


De futuro, e preferencialmente antes da época dos exames, ando mais de táxi. “Senhor taxista, precisava aqui de umas explicaçõezinhas de álgebra linear molecular cinética…”

A jeito de conclusão, uma ideia para o sindicato: - Taxistas? Não!“Especialistas humanos em navegação”!






Dados retirados de
:http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/09/080914_cerebro_taxistas_pu.shtml
14/09/2008 , Elizabeth Mitchell, BBC News

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Ode a Setembro

Setembro é sem dúvida o meu mês favorito.
Não tem a ver com o facto de algures por esta altura ser o meu aniversário. É muitíssimo mais do que isso. Trata-se de uma época de grande mudança. A entrada num novo ano lectivo ou profissional, a pagina em branco à nossa espera.

Francamente, será que só as cadeias de hipermercados se dão conta do potencial deste mês? A segunda quinzena de Setembro mete o 31 de Dezembro num chinelo. Não há melhor altura do ano para aplicar resoluções do que esta. Saibam gerir Setembro e provavelmente o vosso ano será tranquilo.

Os rituais são essenciais. Há muito para reflectir. Como a compra do material novinho em folha, acompanhada dos dilemas que a variedade acarreta. Qual a caneta mais confortável, elegante e económica? Pormenores que num vasto conjunto podem ser decisivos para o nosso desempenho futuro. Graças aos vários Setembros, não tenho onde meter tantas esferográficas. Mas não me queixo, até agora valeu a pena o sacrifício.

Este mês, numa atitude ecológica, não comprei material novo e optei por escolher um novo repertório a partir da enorme gama por estrear que ainda possuo. Admito que não é apenas o amor ao meio ambiente que me move. As criancinhas levam ainda mais a sério que eu este processo de renascimento e invadem febrilmente os hipermercados nestes dias. É preciso dar lugar aos mais novos.


Prevalece, no entanto, o hábito de escolher um novo horário, ponto alto desta azáfama. Na minha decisão, elegi umas salutares 9 horas de sono como a maior das prioridades. Adivinha-se um óptimo ano.

Ai que prazer...


LIBERDADE

Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...

Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.

Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!

Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.

E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...

Fernando Pessoa



Na última semana, todos os dias após as 12h e 30min, minha hora de acordar, tenho recitado religiosamente o início destes versos. Ah, viva a poesia!

Estreia



Actualmente, toda a gente tem um blog. Quando digo toda a gente penso até na minha mulher-a-dias, sem desprestígio maior para ela. Para dizer a verdade, não tenho mulher-a-dias mas se tivesse a sra escreveria de certeza num blog.

Sempre fui grande fã de composições, até aos 12 anos de idade. Escrever qualquer coisa legível aos 21 anos parece-me muito mais complicado. Por isso, não costumo escrever nada.

A chatice é que permanecer nesta situação traz um je ne sais quoi inquietante. Confesso que, cada vez mais, tenho vindo a desenvolver um certo medo de me esquecer do que vou fazendo e sentindo. Já aconteceu e vai voltar a acontecer. Além disso, é incómodo uma pessoa dar por si a tecer mentalmente prosas fantásticas a caminho da 2ªcircular.

Assim, também eu me decidi render à blogosfera. Diários não me seduzem nada, até acho que estão fora de moda. Escrever esporadicamente alguns comentários acerca do meu dia-a-dia e do que vai no mundo não será mais difícil que redigir relatórios sobre colónias de bactérias e temas semelhantes. Se o blog correr bem, um dia mais tarde imprimo tudo (pode-se fazer, não pode?) e os meus bisnetos agradecem.